Homens de preto(Progresso de São Paulo)
Juvenal, homem simples, acabara de desembarcar no tumultuado terminal rodoviário do Tietê-SP, vindo do "norte". Assustado, percorre os saguões, observa os painéis, letreiros, um coral que se apresenta no meio do salão, o vai e vem das pessoas apressadas... “Quanta novidade! Uma escada que sobe e desce sem precisar que ninguém gire a manivela; coisa do outro mundo!” Admirava Juvenal!
Puxando sua pequena bagagem, segue o fluxo. Retira do bolso um pequeno papel; ali está anotado o endereço do seu destino: "Rua da Paz, 50 - Jd. São Jorge". Juvenal, simplicidade em pessoa, mestre do campo, matuto em cima da escada que rola. Tomado de coragem, sai em busca de ajuda. "Povo atencioso!" Admirava Juvenal.
Já de bilhete na mão, segue rumo às “borboletas". Observa, desconfia, fica nervoso, mas segue o fluxo. Homem esperto! “O metrô... Grande invenção... Quanto progresso! Como é grande! Como corre! Quanta gente!” Era o Juvenal maravilhado. Passa um, dois, três. Muitos trens... Juvenal ali, encantado com tanta modernidade. Finalmente, resolve seguir viagem.
“Ponto final, tenho que desembarcar no ponto final", pensava. De repente, a cidade desaparece. Juvenal se desespera; busca nas pequenas janelas a cidade que estava ali há poucos minutos; observa nas pessoas; percebe que está tudo tranquilo, então relaxa. Uma moça muito simpática lhe oferece o assento. "Povo atencioso!" Admira.
Uma voz: “Senhores passageiros, desculpe incomodar a viagem de vocês. Tenho minha mãe doente, meu pai desempregado, necessito da ajuda de vocês, pode ser um passe ou qualquer quantia. Que Deus abençoe vocês!" Juvenal ouve com atenção. "Coitado, darei-lhe um trocado", pensou, e assim fez. Sentindo-se orgulhoso, útil, ajeitou-se no banco e fechou os olhos para agradecer.
Estação Sé. "Senhores passageiros, desembarquem pelo lado esquerdo do trem!" dizia uma voz rouca. Juvenal apressa-se:
—— É o final, é o final?
Perguntava desesperado, sem se dirigir a ninguém.
—— Não, senhor. Responde uma voz no meio da multidão.
Juvenal se acomoda novamente. Um garoto aproxima-se e joga um pequeno pacote no seu colo; assustado, olha desconfiado, mas logo entende e paga para o garoto. “Que gente estranha”, pensa. A viagem segue. A cada estação, uma surpresa, mais uma ajuda, mais uma compra, mais gentilezas, mais novidades... Os mundos se misturam. O simples Juvenal já não se sentia mais tão deslocado.
Alguns minutos depois:
“Senhores passageiros, solicitamos a todos que desembarquem nesta estação!”
Todos se levantam.
Que aflição! Pobre Juvenal! Com os bolsos cheios de balinhas de goma, chicletes, lixas de unhas, canetas, adesivos, retoma a bagagem no ombro e desembarca. Segue o fluxo. Novamente diante das escadas que rolam. De repente, um tumulto toma conta do espaço. Pessoas correm de um lado para o outro, gritam. Juvenal, assustado, pergunta no vazio:
_ Meus Deus, o que está acontecendo? O que é isso? Homens de preto?!
Sem resposta, encosta na mureta e passa a observar tudo em sua volta. Homens gritam sem parar:
_ Litoral, litoral, por aqui. Maresias, Praia Grande, litoral, litoral!!
São os “puxadores” de passageiros para os “perueiros”. Logo entende a razão do tumulto. Lá estavam os “homens de preto” tentando manter a ordem.
Juvenal ficou por ali muito tempo, observando as pessoas apressadas que cruzavam as “borboletas”, para entrarem, para saírem; bem-vestidas, mal-vestidas, bonitas, feias, alegres, tristes, pedindo, vendendo... E os “homens de preto” ali, atentos; espantando os “puxadores”, encaminhando deficientes visuais, ajudando cadeirantes, expulsando pedintes dos saguões do metrô, circulando na multidão. Juvenal ali, três horas se passaram. Meio atormentado com tanto movimento, puxa do bolso o papel que traz o endereço do seu destino. Olha e guarda novamente. Num impulso, pega sua bagagem e segue rumo à escada que leva de volta ao subsolo. Decidido, toma o primeiro trem que encosta na plataforma. Acomoda-se e inicia sua viagem de volta.
“Que grandeza!” pensava enquanto seguia. “Conheci São Paulo. Já posso voltar para minha terra. Que progresso! Sem sair do tal metrô, conheci todo o progresso da cidade: a modernidade, a beleza, a cultura, o sucesso, o companheirismo, a solidariedade, a miséria, o desemprego, a concorrência e os “homens de preto”. E seguiu seu caminho de volta à rodoviária, decidido a voltar para sua terra natal. Descobrira que não existe melhor lugar para viver, o campo.
Grande Juvenal!
Renilda Viana
Enviado por Renilda Viana em 28/11/2024